O toque aveludado das notas fluía na densa atmosfera, penetrando na sua invisível teia abafada, apesar das largas janelas esvaídas para a rua. Era-lhe difícil respirar e a cabeça doía-lhe. O peito implodia num sufoco progressivo que as teclas acariciadas pareciam não conseguir corresponder… uma ingratidão muda para com esse gesto primário de ternura que as fazia viver.
“Não! Não é isto que o meu corpo quer ouvir!” gritou interiormente, ouvindo-se, porém, tão claramente quanto as melodias que já não tinha a certeza de serem reais e, rebolando as têmporas por entre o abraço apertado da escuridão, deixou-se enterrar vertiginosamente para trás, com o piso fugindo-lhe dos pés na inspiração de mais um som vazio, com a nuca embatendo nessas molesas e a consciência afogando-se nesse arrepio.
"Mas… que crescendos tão doces, que toque tão suave, que segurança tão atemporal! Ah!", quão impossível lhe parecera esse estático orgasmo vegetal, mas quão pacífico na descida quanto a queda para outras alturas.
Um corpo aproxima-se-lhe dos parapeitos e a sua visão atira-se-lhe para fora dos aposentos onde as teclas batiam…. As vestes envolvem-se-lhe nos braços, percorrendo-lhe a pele descuidada, mas não sente comichão. Ali os ares escorregam mais depressa que os sentidos lhe permitiam discernir, e a música, apesar de espacialmente confinada ao mundo que deixara, eleva-se-lhe no espírito como se cada célula lhe fora um ouvido, pulsando notas invisíveis, qual som no vácuo.
“Adeus homem-galinha que todas as noites te empoleiras no beirado… o meu voo faz-se sem asas e o teu peso de Homem não te permite voar” – gritou, em direcção à estranha lua que várias voltas dava no espectro de uma noite só…
“Cóoo… coroc…” – o burgesso animal rebolou sobre o papo e estatelou-se na calçada, esborrachando o pacote de pipocas temperadas com um molho diferente – “Amanhã visitar-te-ei de novo, assim que me consiga lavar… é que nós, os homens, gostamos tanto de banho quanto uma galinha de ovos, e essas águas apenas vertemos para não mais nos preocupar. É essa a nossa generosidade”.
“Está calado e cala-te gordo animal! Não te assaria no forno nem que foras depenado! Nestas alturas apanharei andorinhas e jamais comerei galinhas, nem em canjas, nem em migas!"
Sobre a visão do arregalado olho lunar, o pintaralho esvai-se em molhos vários, esborrachado no chão, afastando-se na subida dos lençois enrolados em ventos, dançando sós nessas alturas inóspitas em que ousara voar.
“Não! Não é isto que o meu corpo quer ouvir!” gritou interiormente, ouvindo-se, porém, tão claramente quanto as melodias que já não tinha a certeza de serem reais e, rebolando as têmporas por entre o abraço apertado da escuridão, deixou-se enterrar vertiginosamente para trás, com o piso fugindo-lhe dos pés na inspiração de mais um som vazio, com a nuca embatendo nessas molesas e a consciência afogando-se nesse arrepio.
"Mas… que crescendos tão doces, que toque tão suave, que segurança tão atemporal! Ah!", quão impossível lhe parecera esse estático orgasmo vegetal, mas quão pacífico na descida quanto a queda para outras alturas.
Um corpo aproxima-se-lhe dos parapeitos e a sua visão atira-se-lhe para fora dos aposentos onde as teclas batiam…. As vestes envolvem-se-lhe nos braços, percorrendo-lhe a pele descuidada, mas não sente comichão. Ali os ares escorregam mais depressa que os sentidos lhe permitiam discernir, e a música, apesar de espacialmente confinada ao mundo que deixara, eleva-se-lhe no espírito como se cada célula lhe fora um ouvido, pulsando notas invisíveis, qual som no vácuo.
“Adeus homem-galinha que todas as noites te empoleiras no beirado… o meu voo faz-se sem asas e o teu peso de Homem não te permite voar” – gritou, em direcção à estranha lua que várias voltas dava no espectro de uma noite só…
“Cóoo… coroc…” – o burgesso animal rebolou sobre o papo e estatelou-se na calçada, esborrachando o pacote de pipocas temperadas com um molho diferente – “Amanhã visitar-te-ei de novo, assim que me consiga lavar… é que nós, os homens, gostamos tanto de banho quanto uma galinha de ovos, e essas águas apenas vertemos para não mais nos preocupar. É essa a nossa generosidade”.
“Está calado e cala-te gordo animal! Não te assaria no forno nem que foras depenado! Nestas alturas apanharei andorinhas e jamais comerei galinhas, nem em canjas, nem em migas!"
Sobre a visão do arregalado olho lunar, o pintaralho esvai-se em molhos vários, esborrachado no chão, afastando-se na subida dos lençois enrolados em ventos, dançando sós nessas alturas inóspitas em que ousara voar.
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